segunda-feira, 27 de agosto de 2012

CRENÇAS E FARÓFIAS

Islantilla, 26 de Junho de 2012

DIZEM que só fazendo a pergunta certa se pode obter a resposta certa.

Dizem.

Mas se me perguntarem por que razão um povo escolhe para seu representante executivo alguém cuja única característica distintiva curricular conhecida – e nem sequer reconhecida – é alguma habilidade primária para fazer farófias, eu responderia: não sei. É que não sou psiquiatra.

E digo mais: não consigo uma resposta minimamente segura do porquê do voto popular – aqui e na Moita – ser «botado» maioritariamente nos sacerdotes desta perversa crença no espírito santo de mercado e, todavia, sempre julguei entender as crendices populares de enviesar os olhos e confundir as inteligências, que se explicavam pela falta de instrução e o consequente pouco acesso à informação. Além disto e por via disto, as promessas eram aliciantes, embora não haja notícias de terem sido alguma vez cumpridas. Elas traduziam-se numa espécie de compre agora e pague depois, mas ao contrário, assim tipo das mal-afamadas compras em grupo. Haveria um céu à nossa espera para nos compensar de angústias, dores e desejos frustrados; quanto mais sofrimento melhor o lugar que nos estaria reservado.

Neste apodrecido tempo pós-cibernético, onde supostamente a instrução é bastante e a informação muita, custa-me agora a entender que se queira e possa sofrer sem recompensa alguma.

Mais grave ainda: que se sofra para que medrem e lucrem os que não sofrem, esses que usucapiram o mundo e lhe estabeleceram as regras, perante o aplauso popular ou a indiferença.

Ver eleger governos compostos por sacerdotes imbecis, cuja única virtude é prometerem-nos com toda a sinceridade o inferno que nos desejam, não pode ser do domínio do social, não pode justificar-se com o anexim de que os povos têm os governos que merecem; isto só pode ser do domínio do patológico.

DOUTORES DA MULA RUÇA

Vendas Novas, 16 de Julho de 2012

CHAPÉUS há muitos, dizia o «Gordo», não aquele sem graça nenhuma e ar de vendedor de cobertores na Feira de Carcavelos, que faz «serviço público» na televisão que os portugueses pagam, mas o outro, que, sendo muito gordo, tinha mais graça do que gordura, o Vasco, o Vasquinho, o Santana.

Com pouco graça, mas bastante a propósito, dizia o Jerónimo que canudos há muitos. É bem verdade. Por alturas do PREC de esquerda, havia as passagens administrativas; findo o processo e no espaço em que se desenvolveram as condições para o atual PREC, nasceram como cogumelos os aviários universitários onde os carreiristas políticos se lambuzaram até fartar. Não foi apenas o Relvas, essa figura sinistra do pós-modernismo salazarengo, que conseguiu de viés atestado de ter o que nunca obteve; ele não tem qualquer licenciatura, mas sim um papel carimbado que lhe saiu na Farinha Amparo. Há mais destas aves tipo cuco, mas creio que é impossível haver outra de aproximado coturno sequer, salvo seja. Relvas é o paradigma.

Pois bem, aquele que inventou Passos Coelho e que até há pouco mandava no governo e em todos os processos conspirativos do mesmo e do principal partido que beneficiou do voto popular, está em processo cadavérico adiantado, mas tem algumas figuras que tortuosamente o seguram, defendem e louvam. Uma das mais execrandas é um antigo «comentador» (?) televisivo, de nome Amorim, que há um ano atrás berrava dependurado da pantalha: «eu sinto vergonha de ter Sócrates como primeiro-ministro do meu país» …

Pela mesma bizarrice anda um certo Relvas em tirocínio – digo um certo Relvas porque é daquela massa que os Relvas se fazem – pois, chefiando a claque dos super-laranjas, acha que o Relvas nada fez de reprovável, que quem tem culpa do que corre contra o mesmo é o Mariano Gago (!). Vergonha e razão para se demitir seria se o mesmo tivesse feito o que o Sócrates fez. Ah! Valente, que ainda te hei-de ver em ministro de estado.

As juventudes partidárias são muito parecidas com as claques ditas desportivas. Nelas se cultiva a rasteira, a tramoia, o louvor asinino do chefe, o impropério, a diabolização da cor contrária, o relativismo moral, etc.

Não são escolas de virtudes, são escolas de vício e não podem ser outra coisa; a natureza não permite.

Depois de aprenderem a colar cartazes, conspirarem e trocarem influências e favores – e é de pequenino que se torce o pepino – os carreiristas que sejam espertos (mesmo que não sejam inteligentes) têm o mundo a seus pés com o beneplácito popular.

Devo desculpar aqui o apoio que Passos dá a Relvas. Penso até que não existem duas pessoas distintas nesta aparente dupla, haverá sim desdobramento de personalidade: Relvas faz o que Passos não deve, uma espécie de Dr. Jekyll e Mr. Hyde.

Mas sabem que mais? Neste momento até tenho pena do Relvas. Já viram o que lhe vai acontecer quando abandonar o pote, usando a nomenclatura do Dr. Passos? Entra num café, num banco, numa estação de correios e vê sorrisos maldosos, gente que cochicha, mesmo que não haja gente a sorrir ou a cochichar.

Isto vai dar em paranoia.

COISAS DE POLIR, COISAS DE LIXAR

Vendas Novas, 21 de Julho de 2012

A IDEOLOGIA da não ideologia, isto é, a ideologia daqueles que dizem que não têm ideologia, mas que afinal sempre que o dizem mentem, tornou-se tão geral e dominante que constitui um dos maiores perigos para a nossa liberdade. O grande paradoxo desta mentira é que mentem uns e ganham com isso e mentem os mais perdendo, para que os outros embolsem. É um sintoma bem claro da nossa decadência, da decadência desta civilização a que se costuma chamar de judaico-cristã, esquecendo que os muçulmanos também fazem parte dela.

Dizem outros que não é bem assim, que há apenas uma certa degenerescência da democracia…

Democracia?

Mas existiu alguma vez no mundo algum país totalmente democrático, isto é, com oportunidades iguais para todos nos domínios político, social e judicial, ou mais não assistimos que à batota de uns serem mais «democratas» do que outros? Ao grande engano de confundir sufrágio com democracia?

Longe vão os tempos da grande consigna: Liberté, Egalité, Fraternité!

E não percam tempo a ouvir os fala-barato que contam aquelas lérias da Grécia antiga, berço da democracia, uma democracia só para os possidentes, onde os escravos não eram gente. Por tal ordem de ideias, aquela coisa dita «democracia orgânica» – lembram-se? – seria até menos má.

Nos tempos de apodrecimento em que nos encontramos já nem o sufrágio merece qualquer respeito. Veja-se como aquele rapazinho de Massamá, que o Relvas colocou a fingir de primeiro-ministro, diz alto e bom som: «As eleições que se lixem». Bom, pode até ter sido apenas falta de polimento, ou os conselheiros lhe terem dito: «é pá, diz umas ordinarices, que o povo gosta».

«Sair do lombo, corrida ao pote, lambuzar-se, fazer farófias, pôr porcaria na ventoinha» é um primor. Eu, se pudesse, emigrava para o Burkina Faso.

Mas voltemos ao princípio. Os ideólogos da não ideologia têm do mundo, afinal, uma ideia religiosa, porém com esta particularidade suprema e nada transcendente: só o transacionável e corretável merece vénia, ritual e reza, tudo o mais é «ideologia» insuscetível de ir à bolsa.

Neste melting pot onde a avareza se louva e a honra anda de alterne, os políticos não passam de atores de óperas bufas; atores que navegam entre o receoso de que os donos dos mercados os pateiem e a esperança de aplausos e cadeiras de veludo para enricadamente descansar.

Sabem que na Idade Média ser onzenário (emprestar a 11%) era um crime tão grave que levava à perda da cabeça ou ao esturricanço na fogueira?

No século XVII ainda se enforcavam os especuladores.

Aos «bank gangsters» da nossa «civilização» decadente lambem-se os pés e pergunta-se: V. Exª. quer ter a bondade de me dar um pontapé no fundo das costas?

A JANGADA DE PEDRA

Vendas Novas, 7 de Agosto de 2012

NÃO ME DÁ qualquer satisfação pessoal ver tanta gente a entrar agora no meu clube, dado que quando me dão razão fico invariavelmente desconfiado, suspeito que me enganei.

O clube que refiro é o daqueles que sempre disseram que não deveríamos ter aderido à UE e muito menos suicidarmo-nos com a moeda única, que é este marco travestido de euro. Um pobre nunca deve associar-se com um rico: vai ter as mesmas despesas e nunca comungará dos lucros.

Não é a primeira vez que a Alemanha se apropria da Europa. Há bem pouco tempo, veio de tanque de guerra, causou milhões de mortos, deixou ruinas por todo o lado e teve de ser empurrada com violência para as suas fronteiras…

Neste momento, vem de banco e os seus exércitos são comandados por generais das finanças que há muito asseguraram as chaves das cidades através da nunca extinta «quinta coluna». Talvez não se morra de tiro, prevê-se que seja de fome. O resultado será o mesmo e as ruinas inevitáveis, mesmo que os prédios não se desmoronem.

Já há dirigentes europeus – nomeadamente o italiano – que falam de um confronto norte-sul. Já mais do que uma vez eu disse neste espaço que o desmembramento da UE é inevitável, havendo dois modelos possíveis: simples e civilizado divórcio ou acontecer à Balcãs. A Jugoslávia foi uma miniatura, um prenúncio.

A tendência imperial germânica é uma doença descrita em milhares de páginas da História. Quem se quiser lembrar da herança de Carlos Magno (século IX) que foi o Heiliges Römisches Reich, que a partir do século XVI passou a designar-se como Sacro Império Romano da Nação Germânica e cujo último imperador (Francisco II) foi desmontado por Napoleão, que lhe disse delicadamente: vá lá brincar às germanizes para a sua terra, só poderá admirar-se com o facto desta UE não se chamar Império da Nação Germânica, naturalmente sem o sacro e sem o romano.

Tivéssemos nós dirigentes patrióticos e estar-se-ia já a tratar da saída organizada do mau negócio em que nos meteram. Se ficarmos à espera da grande implosão é melhor que nos lembremos da rocha, do mar e do mexilhão.

E não se assustem com o que dizem os quintacolunistas, que sair do euro seria um blá-blá-blá.

Não somos um país pobre – isso é mentira – somos um país de pobres, que é coisa bem diferente. Melhor seria dizer espoliados.

O nosso azar foi a falta de um cataclismo que nos proporcionasse cumprir o nosso destino atlântico de Jangada de Pedra, mediadores dos três continentes: África, América e Europa. Isto só seria possível exportando – expulsando e desnaturalizando – para o Império Germânico a nossa «elite» (?) política que, formada na colagem de cartazes e doutorada com diplomas saídos na Farinha Amparo, que se pendurou, servindo-se da nossa passividade, nos tronos com que exerce o seu diabólico ofício.

ABASTARDAMENTO E DECADÊNCIA

Vendas Novas, 20 de Agosto de 2012

QUE as sociedades ocidentais de mercado, atingido que foi o seu estádio de capitalismo financeiro parasitário, se encontram em acelerado grau de decadência, não é novidade para ninguém, mas desta constatação à definição e enumeração das causas é que poderá haver divergências. Para uns, é assim porque assim o Marx previu – versão técnica da profética de Nostradamus –; para outros deve-se à transferência industrial do Ocidente para o Oriente, nomeadamente para o mandarinato de Pequim, a que os jornais já nem sequer ousam chamar de comunista.

Pode ser tudo isso, mas é sobretudo a rapina e a busca desenfreada pelo lucro que a desregulamentação permite e incentiva.

Todavia, não é líquido que toda a decadência imperial implique o abastardamento geral a que assistimos na ordem do tempo que agora passa por nós. Este abastardamento, sendo geral, tem maior relevo no campo da justiça, da comunicação social e no modo de produção da atividade política. As massas – ou o povo, se quiserem – vão sendo corrompidas à medida que lhes satisfazem os instintos, ao mesmo tempo que são condicionadas pelo medo, não vá o diabo tecê-las.

O medo está instalado na sociedade portuguesa e, mais ainda que o medo concreto, o medo de ter medo.

No campo da justiça, não vale a pena apresentar muitos exemplos; fazê-lo seria chover no molhado, mas creio ser de trazer aqui os seguintes.

Em Viana do Castelo, à revelia da lei e das disposições autárquicas, mormente no que se refere a licenças, uma organização de torturadores de feras bovinas recorre aos tribunais para impor a sua selvajaria. Colocando-se acima da lei, naquela atitude que Marinho Pinto vem há muito denunciando, o juiz decide a favor dos torturadores. De outro jaez, mas suscetível de, no mínimo, nos incomodar, é o desgraçado acórdão do Tribunal do Barreiro que, ao inocentar os arguidos do Freeport, resolveu condenar o Sócrates para toda a vida, com o argumento de que lhe queria dar a oportunidade de defender o bom nome. Como, depois de sete anos de investigação, não se encontrou rasto daquilo que se queria encontrar, pede-se mais investigação, que se sabe impossível, dadas as prescrições… mas fica o possível: o pasquim do costume, quando fizer investigações aos almoços de Sócrates, em Paris, acrescentará sempre que não foi condenado no Freeport devido às prescrições, enquanto para povo fica a ótima oportunidade de murmurar pelos cantos: pois, os grandes safam-se sempre.

Com a imprensa, é uma delícia ver o coro de defensores das relaxadas russas que se permitiram um ato de vandalismo no altar da Catedral ortodoxa de Cristo-Salvador, em Moscovo. Se eu não acho exagerada a pena – dois anos de prisão – para as jovens rufias? Claro que acho. Limpar retretes durante seis meses seria mais indicado, mas não sou juiz aqui, quanto mais na Rússia. Mas vejam como a imprensa escamoteia tanta coisa. Dizem as tais que fazem parte de uma banda PUNK. Punk, em inglês, tem sempre sentido pejorativo e quer dizer, entre outras coisas, rufião e prostituta. Depois, o maravilhoso nome Pussy Riot, que pode ser traduzido por as ratas revoltadas – ratas no sentido de vaginas – diz bem da consciência política destas marginais. E será que conhecem a bela letra da cantiga, que chama rameira à Virgem Maria e tem como slogan «ó m… de mãe de Deus, leva contigo o Putin».

E que tal, se fosse um grupo Taliban a fazer o mesmo no altar da Sé?

Uma das características do nosso abastardamento geral, que os media tanto promovem e incentivam, é precisamente o relativismo moral…