terça-feira, 22 de novembro de 2011

UM COLAPSO INEVITÁVEL

Vendas Novas, 22 de Novembro de 2011

QUANDO aprendi Contabilidade, já lá vai mais de meio século, insistia-se na ideia de que a um débito corresponde igual valor de crédito, mas nos dias que correm parece que nos querem convencer de que os países não entram nesta lógica, que todos devem e que não há, se excetuarmos a China, nenhum que tenha a haver, o que é uma impossibilidade contabilística e aritmética. Assim, a coisa só passa como caricatura para a crise, caricatura que se reforça pelo constante esgrimir da grande ameaça que é essa espécie de espírito santo financeiro que dá pelo nome fantasmagórico de «os mercados». E já aprendemos com língua de palmo que não podemos nem devemos enervar os divinizados mercados. E o que são estes mercados, sucedâneos da crença em Deus? São o regresso daqueles que Jesus, segundo o que dizem os que creem nos Evangelhos, expulsou do Templo de Salomão, avisando que se os deixássemos regressar estaríamos perdidos. São meia dúzia de banqueiros chupistas que se abastecem nos bancos centrais a juro simbólico do dinheiro que vendem aos estados de forma onzenária. Aliás, emprestam mais de seis vezes o que vão buscar, pois criam eles próprios uma moeda virtual através dos truques do crédito, mediante aquilo que se usa chamar de moeda escritural. Um negócio das arábias!

No caso da EU a coisa tem as características do conto do vigário, mas em dimensões germano-mastodônticas. Na última década, a generalidade dos estados endividaram-se internamente em montantes colossais e os países periféricos – como é o nosso – encontram-se agora à beira do incumprimento perante o exterior.

A mensagem dos procuradores da especulação internacional e dos seus representantes em Portugal – os quatro Cavaleiros do Apocalipse (Relvas, Gaspar, Passos e Álvaro) – foi assimilada pela maioria dos portuguesas devido àquele gosto pelo sofrimento que enriquece o fado e empobrece a dignidade. Temos de sofrer e pronto. Ou prontos, como é mais vulgar dizer-se. O fado segue para património imaterial da humanidade para fazer simetria com a desmaterialização do conteúdo dos nossos bolsos. Há que empobrecer até ao nível do miserabilismo e só no fim saberemos quantos pobres foram necessários para a criação de novos ricos. Assustam-nos com a nossa saída do euro, mas o certo é que essa saída é inevitável, estamos apenas a adiar o momento. Nunca devíamos ter entrado – entrar foi um erro colossal – mas há que preparar uma saída o menos custosa possível, coisa que será bom para nós e para a Europa em que nos pendurámos como macaco à procura de banana.

Errámos, reconheçamos o erro, porque persistir no mesmo só pode ser estupidez ou masoquismo. Se não sairmos a bem e negociadamente sairemos a mal, seremos expulsos e o colapso será fatal como o destino.

Subscrevo na íntegra as teses do professor João Ferreira do Amaral que, para mal dos nossos pecados, é uma voz a clamar no deserto.

ABDUL CADRE

2 comentários:

  1. "Se não sairmos a bem e negociadamente sairemos a mal, seremos expulsos e o colapso será fatal como o destino."

    Exacto, exacto!

    O problema é mesmo esse, nunca devíamos ter entrado e ou saímos ou estaremos condenados ao empobrecimento perpétuo, perpétuo não, pois a História ensina-nos que, este tipo de situação acaba numa revolta social violenta.

    Mas, o pior, é que os que nos meteram no Euro sabiam que isso iria dar disparate mas, esse disparate, era uma oportunidade de ouro para aprofundar a integração europeia. E foi esse o único objectivo do Euro, acabar com os Estados Nação e centralizar a Europa num único Estado ao bom estilo prussiano.

    Só que se esqueceram de um pequeno pormenor, dos povos das diversas nações europeias, esqueceram-se de lhes perguntar se queriam um Estado único na Europa e se estavam dispostos a sacrificarem-se por algumas gerações para o obterem...

    Não perguntaram, avançaram à sua responsabilidade e agora, como ainda estão no poder, recusam-se a pedir desculpa às nações e, para não confessarem o erro e a falta de democracia, recusam-se também a aceitarem medidas correctivas que passam sempre pela recuperação das moedas nacionais.

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