segunda-feira, 22 de maio de 2017

MALLEUS MALEFICARUM

 

Quando me confronto com a muita raiva à solta nas redes sociais, quero convencer-me que possa valer como uma enorme catarse. Seria bom que assim fosse. É o meu aldo optimista de olhar para as coisas. Mas, convenhamos, passa-me depressa, porque de imediato me vem à lembrança o muro das lamentações, em Jerusalém, que me obriga a esta interrogação: Não será o Facebook, por exemplo, um gigantesco muro cibernético de lamentações?

Estas cogitações levam-me a murmurar baixinho, para que ninguém oiça e se ponha a suspeitar que também eu me lamento, que é demasiado comum o vício de nos especarmos frente aos muros, ora chorando, ora espumando de raiva, como lobos enjaulados. Quando é que aprendemos a dar a volta aos muros, já que nos sentimos impotentes para acabar com eles?

Querem os judeus mais crentes, daqueles que entendem que só é verdade o que os seus textos religiosos acolhem, que aquele muro onde vão carpir mágoas seja o que resta do lendário Templo de Salomão, pouco lhes importando que a Arqueologia diga que não é verdade, que se trata do que sobrou de um antigo templo romano dedicado a Júpiter. Pode bem ser que esta devoção equivocada tenha sido (e ainda possa ser) espiritualmente terapêutica para estes crentes, coisa que eu não creio, embora caiba lembrar aquele dito oriental de que pouco importa se um gato é branco, se é preto, é preciso é que apanhe ratos.

Querem os cibernautas mais devotos da NET, mesmo que descrentes da vida, que os seus protestos raivosos, as suas violentíssimas (mas passageiras) indignações e outras provas de vida virtual demonstrem Urbi et Orbi o quanto estão atentos e não perdoam comportamentos fora do manual.

Todos os muros – ou não seriam – servem para separar e onde há separação há ódio. Ódio do judeu mais fundamentalista à gente gentio (os goy); ódio do cibernauta ao mundo e à vida. O judeu atribui humanidade a todos os seus; o cibernauta só a si próprio, porque o mal do mundo é os outros não serem como só ele é…

Ele, com o seu computador e a sua raiva, é uma versão pós-verdade do martelo das bruxas. É por isso que martela nas teclas e na pachorra de que está do outro lado do muro.

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