quarta-feira, 24 de agosto de 2016

UMA AJUDA AO RACIOCÍNIO

 

Suponhamos que um agente da autoridade, de preferência feminino, chega junto de uma mulher que usa burkini, na praia, está bem de ver, e lhe diz, sem enjoo nem olhar de coruja, «bom dia, minha senhora, desculpe incomodá-la, é de sua livre vontade usar essa vestimenta?».

É claro que isto somos nós a delirar, porque é muito difícil alguém imaginar um agente da ordem (?) a tratar com decência e como cidadão quem, progressivamente, vai sendo objecto de redução à categoria de sub-humano pelos cínicos de serviço nos media e na política. Mas adiante. Suponhamos, continuando este delírio, que a cidadã diz que sim. O caso está arrumado e a agente partirá à procura de carteiristas e vendedores de bolas de Berlim estragadas. Se a cidadã disser «não, senhora mulher-polícia, eu sou uma desgraçada, eu até queria fazer top less, mas o meu marido não deixa e a minha família obriga-me a andar assim vestida», é evidente que terão de ser tomadas medidas, não contra a cidadã e o seu burkini, como em Cannes, mas contra o abuso do poder familiar de que a cidadã é alvo. Se alguém tiver de ser multado ou preso, não pode ser ela.

Só mentes doentes e atitudes doentias podem levar aos procedimentos que se conhecem e os inquisidores aplaudem.

Se me der a travadinha e me vestir de galochas, capotão impermeável, um capacete de escafandrista na cabeça e for a banhos em Cannes, posso ser motivo de risota, mas não sou multado nem preso; os inquisidores locais não me acusarão de prejudicar o turismo, antes pelo contrário, farão de mim atracção turística. Posso até ser entrevistado para a televisão. «Por que é que o senhor se veste assim para andar na praia», pergunta o entrevistador entusiasmado pelo exclusivo conseguido. Aí, faço o meu sorriso de humano autêntico e de raça superior e digo: «porque não me apetece vestir assado…»

Abdul Cadre

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